terça-feira, 21 de outubro de 2008

memórias póstumas


Lembrei que não faz tempo,

sentava naquela poltrona já meio velha, gasta, com uma toalha de rosto, pra aplacar a minha água . Era tudo tão drama, berros, um corpo largado oscilando na posição feto de ser, procurando o útero que já não estava mais ali. Era um auto-colo, uma boca aberta , soluços altos e depois uma gargalhada pra não morrer. Era muita gargalhada, a tristeza era cômica, extremada , ficava de palhaça e platéia de mim. Espelhava-me para ver, ver de perto, a cor da água salgada que brotava dos olhos, imensos, ali extasiada, querendo fundar a ciência da tristeza. Um dia filmei, queria rir mais daquela que não sabia de mais nada, e sofria, achando que valia aquele porque. Foram poses, fotos em PB , alguns minutos chorados vistos na TV. A tristeza era boneca e maquiagem.Hoje sem saber ainda o porque , quis entender, como uma antropóloga dos vestígios do chão, do dia a dia de um ano passado , da poeira que sempre acumula nos objetos, do cartão guardado, da flor jogada fora que não tinha nem batata pra crescer, quis saber " pra onde vai tanta dor". Quando ela passa, é porque vazou,evaporou, porque cristalizou, de tão dura não se sente mais, ou porque foi vivida e está ali apenas como uma marca do que não é mais. Aquela tristeza chegava a ser feliz, de tanto que foi. Era viva. Vida líquida. Existia um prazer mórbido ali, livre passagem para ser clichê ao extremo , dramaqueen declarada, personagem completamente alterada, dramaturga fazendo da dor coisa bem humorada , do palco da tristeza berrava “não quero nunca mais sentir isso” , já sentindo pra sempre que aquilo tava indo. Hoje corre a jato , tudo fica ali no A+ , nos músculos, mas não altera batimento, não atordoa mais com vigor , fica num canto da memória inexpressiva. já não é. esparramou.
Sempre falam que passa....é Passa...
Lembrei , já faz um bom tempo...é. Foi-se o que eu achava que era...e ainda bem.

2 comentários:

Simonetta disse...

"flor jogada fora que não tinha nem batata pra crescer" diz tudo...
o que é fake provoca muita dor...
pra que a gente cresça e assuma o próprio valor.
como diz Clarissa, cedo ou mais tarde, não se trata de idade cronológica, todos se deparam com "um predador, que se apresenta como um grande sedutor mas na verdade planeja o assassinato" de tudo o que é criativo, bom pra vida de verdade.quando sobrevivemos a esse encontro passamos a experimentar uma autêntica liberdade e confiança em nós mesmos.
O nosso Self sorri e agradece...rs
XÔOOOOOOO ilusão!

A Menina Sem Século disse...

é tem situações na vida que realmente sao muuito sedutoras e predadoras que deixam a gente de pernas pro ar.
meu self gargalha, acho que passei dessa fase.
thanks

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